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Objetiva o autoconhecimento como forma de lidar de modo criativo com nossos problemas.

São eventos capazes de ajudar-nos a encontrar caminhos para nossas vidas.

Médica em Carazinho- RS desde 1984, hoje exerce ginecologia e psicoterapia junguiana.


sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

O Câncer

O câncer tem sido um tema que muito leio, convivi com alguns mais leves enquanto outros levaram amigos e familiares. Começarei a escrever pequenas reflexões sobre isto.
 
Hoje começo apontando o que muitos já perceberam que é o mal do século. Tem acometido as mulheres nas mamas e os homens na próstata. Rins, intestinos e pulmões ... também estão aumentado dia a dia.
 
 
 Mas... E no coração?
O que faz com que seja tão raro?
 
 
 
Aprendi com a vida que frente ao adoecer tem-se caminhos a percorrer. Sim, a toda evolução médica. Acolher os protocolos de cada adoecer e entregar-se a equipe profissional que estará lhe ajudando.
Mas... Não apenas, ao homem não cabe vencer o câncer e sim compreendê-lo de modo a poder compreender a si mesmo. Se acolhido a tempo ele pede por uma gratidão e uma nova responsabilidade consigo mesmo.
Ao diagnosticar um câncer... Num primeiro momento sempre passei ao paciente o momento da entrega, confiança e ir à direção que lhe fosse indicada.  Cirurgia? Quimioterapia? Radioterapia?
Sim, é muito lendo, doloroso e difícil, mas não isento de significado.
 
A posteriori meu questionamento sempre foi:  Houve transformação?

Mitos?

Questionar o que são os mitos? Bobagens? Histórias contadas?
Nas palavras de Brennan, e Brewi:

 
 
 
Mitos são grandes poemas.
 
Quando eles são tidos como inverdades  ou como fábulas históricas primitivas, eles estão sendo mal interpretados e abordados.
 
 
 
Os mitos não falam de fatos históricos, mas de temas de nosso mundo interior de imaginação, de verdades de nosso próprio ser e de nosso universo.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

O banho!

Hillman  em Psicologia Alquímica diz que não se  deve realizar nenhuma operação até que tudo tenha se tornado água. Frente a um problema tem-se que antes  dissolver a atitude original.

A palavra "problema" refere-se, em suas acepções originais, a xadrez, matemática, estratégia de batalha - todas condições apertadas.  Nós nos rendemos e cedemos, e a mente, focada em resoluções, larga sua própria atitude que busca as resoluções.

Mas..
...No banho, força de vontade torna-se lassidão...
Então há que se deixar a análise racional e esperar pela emoção, os devaneios que reunidos num tanque, misturam-se, afundando e encontrando saídas. p.98.



Discriminações ficam obscuras.
Isso e aquilo confundem-se, misturam-se; certo e errado, e suas culpas tornam-se flexíveis e empapados; pouco importam, nenhum fato concreto, nenhuma certeza sólida à qual se apegar.
 
 
 
   Tudo cede à água quente.
 
 
                                    Abrandamo-nos conosco mesmos.
Perdemos a pressa de chegar, nenhuma correria."
 
 

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

... O dom...

Vou sugerir um filme.
E coloquei uma frase dita nele:

Você tem razão. você não é normal.
Você tem o dom de ensinar e não é apesar da sua doença é por causa dela.
 
 
 
 
 

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Meia idade... Orar e brincar!


Uma leitura que parece uma oração: Um estado de alma!

 
Na segunda metade da vida, vamos relaxar e dormir e, acima de tudo, vamos novamente aprender a usar o lazer e orar.
 
Somos aquilo que somos, e a realização, a aceitação e a fé nisso irá cultiva o desdobramento deste momento.
 
Não podemos ter fé maior em Deus e no processo da vida em que estamos do que a fé que é despertada pela oração e pelo lazer.
 
Em ambos os casos, deixamos de lado as determinações do ego, suspendemos essa terrível seriedade e permitimos que nosso si-mesmo fique, por algum tempo, sem causa, sem meta.
 
CRIANÇA REZANDO AO SE LEVANTAR
Estamos diante do Senhor, aceitando as coisas como elas são com nós mesmos, com o mundo, com aqueles que amamos - deixando que as coisas aconteçam naturalmente;
rezamos e brincamos. 
Brennan & Brewi

Aceitando-se...


A plena aceitação de nossa humanidade é a plena aceitação da
FORÇA do bem e do mal que existem dentro de nós.
 
 
Se desejamos ser verdadeiramente humanos, precisamos alcançar o ponto em que, quando olhamos para fora, 
através das grades de nossa prisão, vemos a lama assim como as estrelas.
                                                 Anne Brennan e Janice Brewi
 



Nossos motivos!

Em Meia-Idade e Vida
de Anne Brennan e Janice Brewi...

Já lemos, já ouvimos, mas cabe relembrar de forma bem escrita:
Agimos assim diariamente ... enquanto profissionais, amiga, mãe e parceira... Sem ao menos refletir.



Não temos consciência de nossos motivos impuros, de nosso egoísmo, de como estamos centralizados em nosso ego. 
Quantas vezes fizemos algo para alguém e não percebemos o que aquele fato significou para nós mesmos?
Muitas vezes o que fizemos para o bem de alguém foi algo completamente distante das necessidades genuínas daquela pessoa.
Acreditamos em nossa bondade e permanecemos inconscientes de nossas próprias motivações.
 
 



sábado, 25 de janeiro de 2014

Recomendo este vídeo de Bernardo Toro.

http://www.youtube.com/watch?v=5nivihNqbXk




Para aguçar a curiosidade...

Um paradigma é um par de óculos que faz com se veja a realidade de uma determinada maneira.

Até então nosso paradigma... é o de ter, poder, ganhar, ter sucesso, êxito...

Necessitamos um paradigma superior: O cuidado. Uma nova ética: cuidado.

Saber cuidar, saber  se relacionar, saber conversar...

Quando amamos cuidamos e quando cuidamos amamos.

Auto estima e auto conhecimento...Sair da inteligência guerreira a inteligência solidária... Inteligência é saber pedir ajuda...

 
 
 
 
 

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

A maior flor do Mundo

Recebi
e repasso e convido
a que assista. 









http://www.youtube.com/watch?v=YUJ7cDSuS1U















































































 

Quando Hermes se impõe!


Estou repassando o Position Paper  apresentado em novembro de 2013  em que  anunciou muito da experiência que vivencio.
 
 
 

 
Quando Hermes se impõe:

Nas asas do Medo um voo em direção a si mesmo.

 

RESUMO
A partir de um encontro com Hermes a autora é colocada em um espaço sombrio e de maior profundidade capaz de gerar o reconhecimento de seus limites, medos e a reverencia frente a força de um deus.
 
I Introdução
             A autora mergulhada em seu processo de formação tem seguido sua jornada com muito zelo. Há que se caminhar em busca do autoconhecimento.  Cabe um movimento em direção ao acolhimento de suas próprias feridas e neuroses.  Trata-se de um movimento, agora visto como sagrado e feito de forma deliberada não isento de medos.

Os artigos anteriores olharam para o feminino de forma projetada. Tratava-se do conhecimento e experiência da médica em relação aos pedidos de outras mulheres em distintas situações que pediam ajuda e acompanhamento clínico.

O artigo que precedeu –Intermezzo: Um espaço criativo entre mãe e filha-, trouxe uma maior aproximação da autora consigo mesmo embora inicialmente tenha questionado a validade em escrever sobre si e sua mãe. Saiu-se da mulher que olha para fora e se olhou com. Durante a apresentação apesar de cuidadosamente elaborada levou a autora a se sentir extremamente mobilizada e exposta. Houve um sentimento de tristeza e de inadequação, um espaço de alma que chorava. 

O intermezzo findara. Então se inicia o segundo ato. Neste segundo ato o movimento pede pela introversão.  Tenciona-se recolher projeções e olhar para a mulher que escreve. É chegada a hora de ir à procura de espaços internos, escuros. Locais que apertam e que se esquivam de ser tocados.

Na tentativa em delimitá-los, descreve-se como logo ali, uns centímetros atrás do peito, um pouco mais a direita, é preto, está circunscrito e encapsulado. Teme-se pelo risco imaginário da dor e impotência que daí poderá advir.

Havia na infância da autora um quarto sombrio, o quarto da avó idosa – neste quarto havia um alçapão. Uma portinha de madeira que levava a um local escuro. Há na memória a descoberta deste espaço, no dia em que foi instalada uma lâmpada interna e que passou a iluminar esta descida. Esta foi a imagem que se criou a iniciar este artigo. Esta imagem já remetia a medos.

O inconsciente tem se apresentado ora por forma de sonhos ora por imagens, porém para este trabalho ele trouxe uma experiência. Aconteceu um encontro, na procura de significados: Um encontro com Hermes.

 
II Desenvolvimento

Neste ir e vir à formação ocorreu uma vivencia. O que aconteceu? Como nominá-lo? Um encontro, um encontro com Hermes. Não foi uma experiência fácil. Estava em viagem e sentiu uma angústia extrema. Foram alguns quilômetros e alguns minutos intermináveis, indescritíveis, em que a autora apenas conseguia dizer a si mesma: Você vai conseguir falta pouco! Apertando a medalhinha que tinha no pescoço como a um amuleto de proteção e abraçou-se imageticamente com o manto verde da paisagem, como se a mãe natureza estivesse a acolhendo. A descrição dos fatos experimentados torna-se totalmente dispensável, ficando apenas a certeza de que algo aconteceu, algo diferente indizível em palavras humanas, porém confortavelmente definido como: Um encontro, um encontro com o deus Hermes.

 

Que deus é este? Filho de Zeus e Maia é o deus do inesperado, da sorte, das coincidências, da sincronicidade.  “é o mistagogo e o psicopompo dos alquimistas, seu amigo e conselheiro, que os conduz à meta da obra. (JUNG, 2006,§238) Aquele que introduz ao mistério. O condutor de almas.

“Hermes está entre nós” diziam os antigos gregos quando um silêncio súbito caía na sala, envolvia a conversa, acrescentava outra dimensão á reunião. Sempre que as coisas aparecem fixas, rígidas, “empacadas”, Hermes introduz a fluidez, o movimento, novos começos e confusão que quase inevitavelmente precede novos inícios. Arianna  Stassinopoulos, The Gods of Greece (BOLEN, 2005, p. 236.)

Hermes o deus dos viajantes – e a autora dentro de um ônibus – o deus das mudanças súbitas de vida. Deus ambíguo, mensageiro dos deuses e das trevas. O deus com asas nos pés viajava frequente e velozmente entre o Olimpo e o mundo inferior, entre o Olimpo e a terra, entre a terra e o mundo inferior. Deslocava-se facilmente entre esses níveis, cruzando sem obstáculos todas as fronteiras. 

Estaria Hermes ali, colocando a autora em um espaço terrível e desconhecido para ela? Não estava onde costumava estar, não estava aonde iria chegar. Estava nas mãos de algo indescritível e assustadoramente poderoso.  Parecia que a própria identidade se dissolvia.

“Murray Stein, analista Junguiano, chama Hermes de o Deus das Passagens Significativas. Hermes é o arquétipo que se faz presente quando há uma transição entre fases psicológicas, especialmente nas mudanças da vida adulta. É deus liminal, presente no espaço transicional (liminal vem do grego limen, que era o espaço sob a soleira da porta, ou o limiar).” (BOLEN, 2005, p. 246.)

 

Hermes é também chamado de o deus da revelação.   Tratava-se de um rito de iniciação? Tratava-se de um teste? Uma travessia? Um rito de passagem? Afinal o que Hermes apontava? Esta situação liminar, em que a autora se encontrou sem nenhum ponto fixo capaz de autenticá-la. Sentir-se fora de seu ambiente normal perder totalmente o controle pela situação de modo a perceber-se rendida. Houve dor psíquica. Houve lágrimas. Houve prece.

As passagens por experiência limítrofes levam ao contato com o medo. Nas palavras de Jung cria-se: “o medo instintivo de perder a liberdade da consciência e de sucumbir ao automatismo da psique inconsciente.” (JUNG, 1971 a,§230)

Vive-se em um mundo de incerteza e iludidos com o controle, mas o medo faz parte e pede por cuidado e respeito. Ele ajuda que se reconheça o que é valioso. Embora se fuja do descontrole, frente ao medo é possível procurar por novas adaptações e por soluções criativas: “No entanto, tolerar a confusão não é um valor cobiçado em nossa sociedade: devemos sempre readquirir a certeza imediatamente, ter visão clara.” (KAST, 2004, p. 46)

Afastada do ambiente habitual houve uma quebra da persona. Neste momento quem era ela? O que estava acontecendo?

Quando nos afastamos voluntariamente de nosso ambiente habitual, estimulamos a compreensão de nós próprios e o contato com as profundezas interiores do nosso ser que podem nos escapar na agitação da vida cotidiana. De maneira normal, nosso senso de identidade depende de nossa interação tanto com o mundo físico quanto com as outras pessoas. Meus estudos, revestidos de livros, refletem meus interesses, confirmam minha identidade como escritor e reforçam minha concepção do tipo de pessoa que eu me considero ser. Meus relacionamentos com minha família, meus colegas, amigos e conhecidos menos íntimos me definem como pessoa que sustenta certas opiniões e que provavelmente se comportará de forma previsível.

Mas posso vir a sentir que esses valores que habitualmente me definem também são limitantes. Suponhamos que eu fique insatisfeito com meu eu habitual ou sinta que existem áreas da experiência ou de entendimento de mim que não consigo alcançar.  Uma das maneiras de explorá-las é afastar-me do meio ambiente atual para ver o que emerge. Isto tem seus perigos. Qualquer nova forma de organização ou integração mental precisa ser precedida de certo grau de desorganização. Ninguém é capaz de dizer, enquanto não o tenha experimentado, se esta necessária destruição dos padrões anteriores será seguida por algo melhor. (STORR, 1996, p.62)

 

Enfim colocada a um espaço em que os referenciais e relacionamentos não se estiveram presentes, houve uma desorganização. Qual foi o perigo real? Que padrões anteriores serão necessariamente destruídos? 

              Houve também sonho em que a seguinte frase foi ouvida: É hora de acolher a negritude. É hora de dizer que não sabe.  Acordada com esta mensagem remeteu imediatamente ao encontro com o medo, o convite a ir às sombras, ir ao porão.

            Nas palavras de Jung o encontro consigo mesmo significa o encontro com a própria sombra e também de uma comunhão com o todo.

A sombra é, no entanto, um desfiladeiro, um portal estreito cuja dolorosa exiguidade não poupa que quer que desça ao poço profundo. Mas para sabermos quem somos, temos de conhecer-nos a nós mesmos, porque o que se segue à morte é de uma amplitude ilimitada, cheia de incertezas inauditas, aparentemente sem dentro nem fora, sem em cima, nem embaixo, sem aqui ou um lá, sem meu nem teu, sem bem, nem mal. É o mundo da água, onde todo vivente flutua em suspenso, onde começa o reino do “simpático’ da alma de todo ser vivo, onde sou inesperadamente isto e aquilo, onde vivencio o outro em mim, e o outro que não sou, me vivencia. ( JUNG, 2006, §45.)

            Ciente e desejoso do autoconhecimento segue-se o caminho à descida, a poços profundos, espaços escuros e desconhecidos.  Abdicar ao ego conhecido a edificado através dos anos. Olhar para este ego que se formou a partir de muitos movimentos e experiências dos quais muitos foram imitações, aprendizados talvez decisivos para um período e desnecessárias em outro, padrões repetitivos provindo da hamartia familiar e agora relativizá-los.

            É chegada a hora de olhar para as implicâncias com familiares com o olhar de quem procura em si este conteúdo sombrio. A teoria é mais fácil e pode-se até dizer a si mesmo: isto deve ser meu.  Mas frente a um fato, ao vivo, quando se percebe já se está atuando dentro do complexo acionado.

Cabe a cada um olhar para os seus próprios conteúdos sombrios, seus próprios diabinhos invasores, que levam a colocar o anel que o dominará. Tem-se a conteúdo teórico suficiente para dar-se conta de forma generosa de que tudo é arquetípico, o ciúme, a inveja, o controle, a arrogância e medo. Tudo existe em todos. Um encontro como este em que nada pode ser feito revela o quantum de libido represado a serviço em esconder estes conteúdos sombrios. Hermes vem e desorganiza, desestrutura , mostra o medo.  

Hollis se refere aquele que desconhece a existência de suas próprias sombras como possivelmente ingênuo, superficial, ou ainda imaturo e inconsciente. Vê a importância da completude do ser humano como uma missão e acarinha os conteúdos sombrios como um caminho para esta possível inteireza. Ele propõe a procura pela sombra a partir das questões:

 

...é (1) onde estão nossos medos, (2) onde somos mais feios para nós mesmos, ou (3) para os muitos acordos diários que fazemos, as adaptações e as negações que apenas aprofundam a escuridão. Esse paradoxo desafiador permanece: Nunca experimentaremos a cura até que aprendamos a amar nossos lugares que não podem ser amados, pois eles também pedem nosso amor. Os lugares doentes estão doentes porque ninguém, principalmente nós, os amou.  (HOLLIS, 2010, p.236)

Este pedido por amor a conteúdos, espaços doentes que estão sofridos, vistos apenas no outro, porém eles estão dentro de cada um, mostra a amorosidade como potencial, como semente transformadora do ser. Olhar para o feio, para as negações, para os “não” que se guardou por anos como inadequados de forma acolhedora. A questão passa a ser a de reconhecer e acolher. Dá para se dizer que a questão da sombra passa pelo amar-se.

Nas palavras de Jung “... terão que renunciar a quase todas as caras ilusões que têm a seu respeito, para deixar brotar algo muito mais profundo, maior e mais belo dentro de si.” (JUNG, 1971 § 26).

Este algo mais profundo esconde a polaridade que está sendo vista como feia, errada e que recebe o preconceito que a exclui da completude. Há que se olhar para estes “feios” e amá-los. Há que se olhar para a dificuldade com eles e abriga-los. Tomá-los no peito e dizer a si mesmo: Este sou eu. Não preciso mais me renegar e nem mesmo abusar de mim mesmo. Sou também assim.

Em nota de rodapé de A Vida Simbólica, Jung cita as palavras de Nietzsche: “Isto eu fiz, diz minha memória. Isto eu não posso ter feito, diz meu orgulho e fica irredutível. Finalmente a memória.” (Werke VII, p.94) (JUNG, 1981, p.202). Há muita dificuldade em se reconhecer os feitos talvez não nobres.

Sente-se também a vergonha e para evitá-la muitas vezes se usa o caminho da insinceridade. Foge-se de todas as exposições capazes de colocar em risco o prestígio. O custo em mantê-lo pode ser o de negar os conteúdos vistos como sombrios.

Em Pedraza (2010, p. 40-41) a partir do Hipólito de Eurípedes, o aidôs (vergonha) de Fedra ele aponta para quatro tipos de vergonha: Uma por conta de divagações psicóticas devido a possessão erótica induzida por Afrodite, uma pela vergonha pública por seus filhos, por uma emoção de dor psíquica e uma quarta pelos complexos familiares. Dentre tantas vergonhas, qual destas já foi acometida? Suas próprias divagações psicóticas? A opinião publica? Pelas dores internas?  Há também os complexos familiares. Quem ainda não sentiu isto?  Estaria a autora em divagação psicótica? Certamente havia uma dor psíquica.

Pedraza (2010, p.41) diz: “O aparecimento da vergonha em psicoterapia é, para mim, índice de uma consciência psíquica em movimento”.

Focar porões levou a espaços escuros e dentro destes foram encontrados os medos.  Porém: “O que ignoramos dentro de nós mesmos chegará, mais cedo ou mais tarde, de fora... como um caminhão em nossa direção na pista errada.” (HOLLIS, 2010, p.13)

Teme-se o que não se conhece.  O medo existe em todos, é da natureza humana. Não há como negá-lo. A vida é repleta de espaços desconhecidos, que poderão ser experimentados de forma mais fácil caso sejam iluminados pela luz de consciência. O seu lado bom é que propicia cuidado e atenção.  O medo permite que se olhe para uma determinada situação de forma mais planejada, organizada e preventiva.

É possível ampliar a confiança de cada um ou até cria-la através do conhecimento, reflexão ou até mesmo por comparação.

            O processo analítico ajuda a olhar também para o medo de forma ampliada, como um guia de vida, ir além da autoproteção para uma forma de existir: O analista James Hollis que ouvia de seu analista em Zurique: “Você deve transformar os seus medos em seus motivos”.

            Quais são seus medos, questiona a autora? Cabe reconhece-los e seguir o conselho acima, transformá-los em motivos? Até que ponto a tolerar, suportar, não está a serviço de um medo escondido?  O que faz com que alguém aguente uma determinada situação dolorosa sem conseguir a coragem suficiente para a sua própria defesa? Covardia?  O covarde não assume suas intenções e atitudes, agride aquele que não se defende, e se este que ele não defende for ele mesmo? Trata-se de um instinto ferido?

            Em Ferreira (2009, p. 1193), ampliando o significado do vocábulo “motivo” foi encontrado o termo “leitmotiv” como o motivo condutor. Aparecendo tanto na música, quanto na literatura como uma repetição de determinado tema que apresenta uma significação especial. Um tema ou ideia que se insiste com frequência. Olhar o medo como “leitmotiv” seria um modo de trazê-lo a consciência e seu potencial transformador?

            O medo é do escuro? Do desconhecido? Um medo que remete ao controle? Controle de si e do outro? Trata-se de poder? Ou ainda em perceber a grandiosidade e profundidade do inconsciente?

É muito maior do que se imagina o numero de pessoas que têm medo do inconsciente. Tais pessoas tem medo da própria sombra. [] o próprio fato de vencer tal medo, quando isso ocorre, já representa uma façanha moral extraordinária, mas não é a única condição a ser satisfeita no caminho que conduz á verdadeira experiência do si-mesmo. (JUNG, 2000, §62)

            Hermes o deus das encruzilhadas voou com suas asas para dentro do espaço de um ônibus e assustou, fragilizou. Havia uma passagem que não estava sendo feita? A escolha esteve sendo feita pelo caminho mais fácil? O chamado foi para um caminho de maior fidelidade a si própria? Autenticidade? Inicia-se um movimento solitário? A nova terra continua inexplorada?

 

No caminho para a maturidade psicológica existe uma passagem crucial, uma encruzilhada em que a escolha não pode ser feita ao acaso; a partir daquele momento de fato os dois caminhos divergirão irremediavelmente. Pode-se escolher o percurso que se apresenta mais fácil, representado pelo compromisso, pelo estar sempre em harmonia para evitar o mal-estar; ou em vez disso, aquele mais acidentado e inacessível, da coerência, da fidelidade a si mesmo, da autenticidade. O primeiro nos promete um passeio, o segundo uma aventura. Quem escolhe o compromisso empreenderá uma ‘visita guiada’ num passeio familiar, numa natureza domesticada, por veredas traçadas e ‘batidas’; quem escolhe a outra via assume o próprio risco e perigo num empreendimento solitário, numa terra inexplorada, onde, como em certos mapas antigos... [] Para aqueles que escolhem a via da autenticidade, semelhantes encontros não só são evitáveis, mas preciosos, porque os ajudam a tornar-se mais homens. (CAROTENUTO, 2005, p.200-201)

 

            O movimento que se inicia certamente é reflexivo e solitário. Hermes libertou o medo, descontrole e a entrega. O medo esteva à espreita e pedia para ser acolhido.

Este encontro paralisou, relativizou o espaço tempo. A autora não se sentia ali e percebia que não lhe cabia nenhum controle sobre aquele tempo que se instalou diferente. Uma exigência a se tornar mais lenta? Um “menos’ a pressa?

No XXI Congresso da AJB, a Filósofa Dra. Olgária Matos referiu-se a uma contemporaneidade apressada com falta de contato consigo e com o outro e que a cultura da aceleração leva a falta de contemplação. Seria a mensagem de Hermes seja um decreto que tire do causal, quer seja medo, ou ansiedade e oriente para que se: Pare! Contate! Aprofunde! Contemple! Uma ordem para a adultez?

            Existe a tentativa em fugir de medos e dos inexoráveis da vida. Projetar no outro ou ainda tentar um retorno ao paraíso uterino, mas será apenas um ensaio. O caminho por responsabilizar-se por si é repleto de temores. Cabe aprender a lida.

            Hollis vê a relação entre o amor e medo como:

O poder do amor está sobretudo na sua vitória sobre o medo. Onde prevalece o medo, não existe o amor. Dada a ubiquidade do medo, o movimento para o amor é um desafio considerável. Somente os que conseguem encarar seus medos, vivem com ambiguidade e a ambivalência, têm condições de encontrar o vigor pessoal que possibilita o amor ao Outro. (HOLLIS, 2002, p.89)

O medo é visto como algo com “ubiquidade”, ou seja, como onipresente. Nada há que se possa fazer. Está aí o grande desafio, amar apesar do medo, deixar com que o amor o supere.

Então cabe aprender a lidar com o medo.  Hollis (2002, p. 83-85) menciona que a psicóloga Karen Horney diz que as pessoas lidam com seus medos de três modos. Um deles são os padrões de submissão que frequentemente estão acompanhados de uma racionalização inconsciente,  pensando estar dando atenção ao outro, um segundo modo hostil e nesta circunstância acaba-se por dominar o outro pelo medo que ele incute, já um terceiro é evitar, esconder-se emocionalmente. Esta atitude pode ser vista como delicadeza, timidez ou educação.

Quem frente ao medo já não esteve em submissão, em poder ou em distanciamento? O que está se negligenciando? A quem? Sua própria jornada? Onde está o amor?

A palestrante Dra Olgária referiu-se a nosso tempo como um “tempo de arrogância”, um tempo em que se exerce uma vontade onipotente. A arrogância é arquetípica, porém fora da medida, é hybris. Nada como um encontro com um deus para trazer de volta a humildade e se perceber a própria arrogância. O ego frente aos deuses se percebe inerme.

Frente a um deus expõe-se a pequenez, mas este momento não permite mais infantilizar-se e sim em trazer a si suas próprias responsabilidades. Os medos apontam e retraem o sujeito que com maturidade deve acolhê-lo e ouvir a musica que toca, o ‘leitmotiv’.

O processo de crescimento em tornar-se adulto e responsável sujeita o sujeito ao risco do erro, da vergonha, da rejeição, da crítica. Quando Hermes se apresentou percebeu-se que o encontro não era mais apenas entre os homens, chegara a um momento em que ele pediu por profundidade, tocou em outro espaço, um espaço das “entranhas”.


III Conclusão 

Frente a esta experiência vivenciada inicialmente como dolorosa, apreender que se esteve nas mãos do deus Hermes, que voou ao espaço que estava e que esteve a conduzir ao mistério, ao contato com sombras, a experiência do medo trouxe outro valor. A percepção do sagrado, a percepção da entrega, do render-se aos mistérios da vida. Havia ainda a ilusão de que poderia controlar a própria vida?

Isto pode acontecer frequentemente na vida das pessoas. Quer esteja acometido de algum adoecer, algum diagnóstico difícil, alguma situação pessoal ou de algum familiar. O mensageiro dos deuses poderá se apresentar e apenas cabe aceitar.

Este encontro também pode ocorrer em situações ditas positivas. Hermes presente. Em uma zona liminar, uma situação limítrofe em que há controle, se está a margem.  E nestas horas e encontros se abrem para questões maiores, procura-se o contato com o divino.

As primeiras imagens que surgiram neste trabalho foram de locais sombrios no próprio peito, passou-se por porões escuros com a lembrança de que foi colocada uma lâmpada, havia uma escada que descia, mas não sem um foco luminoso. 

Houve um encontro arquetípico. A chegada de Hermes levou a um espaço desconhecido, houve regressão da libido houve um furto psicológico capaz de:

O furto psicológico é uma atividade natural e básica de Hermes na psique e está intimamente ligado com as sandálias aladas, símbolo do deus alquímico Mercúrio. A forma como as confeccionou e usou, indicam um movimento para trás, o que associa à concepção de Jung, do movimento de regressão da libido. Este movimento é a regressão necessária até a memória pessoal e arquetípica, que possibilita o furto psicológico e aponta novos insights, abrindo caminho rumo ao desenvolvimento psíquico. (LUCONI, 2001, p. 66)

Olhar para muitos comportamentos de sua vida que acontecem e aconteceram de forma automática. Reconhecer que havia uma mulher Atená em ação e que pede em espaço reflexivo pela possibilidade em transformar. Permitir o nascimento de aspectos dionisíacos.

Nos sonhos de homens e mulheres contemporâneos, esse arquétipo está frequentemente representado pelo bebê precoce que fala com o sonhador ou que, de alguma outra maneira, não é evidentemente uma criança comum. A sensação pessoal de que a “minha” vida tem um sentido sagrado, ou que há elementos tanto humanos quanto divinos na “minha” psique, ocorre quando a pessoa entra em contato com o arquétipo da criança divina, o que muitas vezes prenuncia o inicio da jornada espiritual de adulto ou seu caminho de individuação. (BOLEN, 2005, p. 368.)

Este artigo teve um deus trapaceiro, que dificultou sua escrita. Ele começou pelo estado de dor. Dor evitada, dor escondida, dor protegida e que neste quinto semestre da formação analítica, sincronicamente aflora. 

O Universo apresentou dificuldades, chamados de “problemas” e estes dados  reais acionam dor, medo,  apavoramento, pânico, o peito apertado, ferido, rachado, colado, com questões sem resposta. 

Como tudo ficará? O que virá? As dificuldades passarão? Haverá bonança? Este é um caos regenerador?


 

 

BIBLIOGRAFIA:  

BOLEN, J.S. Os Deuses e o Homem: Uma nova psicologia da vida e dos amores masculinos. São Paulo: Paulus, 2005

CAROTENUTO, A. Eros e Pathos; Amor e Sofrimento.  São Paulo: Paulus, 2005.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio. 4 ed. Curitiba: Positivo, 2009.

HOLLIS, J. A Sombra Interior: Porque as pessoas boas fazem coisas ruins? São Paulo: Novo Século, 2010.

________ O Projeto Éden: a busca do Outro mágico. São Paulo: Paulus, 2002.

 

JUNG, C. G. Aion Estudos Sobre o Simbolismo do Si-Mesmo. Petrópolis: Vozes, 2000.

________A Vida Simbólica. Petrópolis: Vozes, 1981.

________ A Natureza da Psique Petrópolis: Vozes, 1971 a.

 

_______ Os arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Petrópolis: Vozes, 2006.

_______ Psicologia do Inconsciente. Petrópolis: Vozes, 1971b

KAST, V. Crise da Vida são Chances de Vida. Aparecida-SP, Ideias & Letras, 2004.

LUCONI, E.B.F. Análise Junguiana: Uma visão mitológica em Busca da Individuação. Rio de Janeiro, 2001.

PEDRAZA, R. L. As emoções no Processo Psicoterapêutico. Petrópolis: Vozes, 2010.

SINGER, J. A mulher Moderna em busca da Alma. São Paulo: Paulus, 2002.

STORR, A. solidão. São Paulo: Paulus, 1996.

http://en.wikipedia.org/wiki/Liminality